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Correntes Invisíveis: A Síndrome de Oslo e o Ciclo da Violência Doméstica

  • Foto do escritor: Eduardo Onofri Pallota
    Eduardo Onofri Pallota
  • 2 de abr.
  • 5 min de leitura
Mulher angustiada representando a Síndrome de Oslo e o ciclo da violência doméstica

O que é a Síndrome de Oslo?


A Síndrome de Oslo é um fenômeno psicológico caracterizado pelo desenvolvimento de sentimentos positivos da vítima em relação ao seu agressor, especialmente em situações de abuso prolongado ou cíclico. O termo foi inspirado na cidade de Oslo, Noruega, onde foram observados e documentados alguns dos primeiros casos estudados deste fenômeno.


Diferente da mais conhecida Síndrome de Estocolmo (relacionada a casos, por exemplo, de sequestro e roubo, nos quais a vítima é feita de refém), a Síndrome de Oslo se manifesta especificamente em relacionamentos interpessoais com dinâmicas abusivas de longa duração, sendo particularmente relevante no contexto da violência doméstica.


As Formas de Violência na Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/06)


A Lei Maria da Penha identifica cinco formas principais de violência contra a mulher:


  • Violência física: qualquer conduta que ofenda a integridade ou saúde corporal da mulher;

  • Violência psicológica: condutas que causem dano emocional, diminuição da autoestima, prejudiquem o desenvolvimento ou visem controlar comportamentos e decisões;

  • Violência sexual: qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, manter ou participar de relação sexual não desejada;

  • Violência patrimonial: atos que configurem retenção, subtração ou destruição de objetos, documentos, bens e valores; e,

  • Violência moral: calúnia, difamação ou injúria.


No contexto da Síndrome de Oslo, as formas de violência mais determinantes são a psicológica e a moral. A violência psicológica é frequentemente o primeiro passo para estabelecer o ciclo de abuso, criando um ambiente de insegurança e dependência emocional. Já a violência moral ataca diretamente a autoimagem da vítima, tornando-a mais vulnerável à manipulação e ao controle do agressor.


Por que mulheres permanecem em relacionamentos abusivos?


As razões pelas quais muitas mulheres não conseguem romper relacionamentos abusivos são complexas e multifacetadas, especialmente quando a Síndrome de Oslo se estabelece:


  1. Dependência econômica: muitas vítimas não possuem independência financeira, o que limita drasticamente suas opções de escape.

  2. Medo de represálias: o temor de que a violência se intensifique caso tentem sair do relacionamento é uma preocupação legítima e frequente.

  3. Isolamento social: agressores frequentemente afastam suas vítimas de amigos e familiares, eliminando potenciais redes de apoio.

  4. Filhos em comum: a preocupação com o bem-estar dos filhos e o desejo de manter a família unida podem ser fatores determinantes.

  5. Normalização da violência: quando expostas a abusos por longos períodos, as vítimas podem passar a ver comportamentos violentos como normais ou aceitáveis.

  6. Esperança de mudança: a crença de que o agressor vai mudar, frequentemente reforçada por períodos de arrependimento e promessas.

  7. Sentimentos ambivalentes: sob influência da Síndrome de Oslo, a vítima desenvolve uma conexão emocional paradoxal com seu agressor, alternando entre medo e afeto.

  8. Baixa autoestima: o abuso psicológico sistemático diminui a autoconfiança da vítima, fazendo-a acreditar que não merece ou não conseguirá uma vida melhor.

  9. Vergonha e culpa: muitas vítimas internalizam a culpa pelo abuso sofrido, sentindo-se responsáveis pela situação.


O padrão de comportamento dos agressores


O comportamento abusivo raramente começa com violência explícita. Geralmente, segue um padrão gradual que pode ser dividido em fases:


Fase de conquista e idealização


O relacionamento começa com demonstrações excessivas de afeto e cuidado. O agressor se apresenta como o parceiro ideal, atencioso e romântico. Esta fase estabelece uma forte conexão emocional que mais tarde será usada como contraste durante os episódios de abuso.


Fase de controle sutil


Gradualmente, o agressor começa a exercer controle sobre a vítima, inicialmente disfarçado de preocupação:


  • Questiona amizades e relacionamentos familiares;

  • Critica escolhas de vestuário, comportamento ou rotinas;

  • Demonstra ciúme excessivo; e,

  • Monitora atividades, ligações e mensagens.


Fase de isolamento


O agressor trabalha ativamente para separar a vítima de sua rede de apoio:


  • Cria conflitos entre a vítima e suas pessoas próximas;

  • Dificulta encontros sociais e familiares;

  • Pode forçar mudanças físicas para locais distantes; e,

  • Desqualifica amigos e familiares da vítima.


Fase de diminuição da autoestima


O abuso psicológico se intensifica:


  • Críticas constantes e humilhações;

  • Gaslighting (forma de abuso psicológico que consiste em manipular a vítima para que ela duvide da sua sanidade, percepção e memória);

  • Alternar entre afeto extremo e frieza/rejeição; e,

  • Culpabilizar a vítima por problemas do relacionamento.


Fase de violência explícita


As agressões se tornam mais evidentes e podem evoluir de psicológicas para físicas:


  • Ameaças verbais;

  • Intimidação física; e,

  • Agressões "menores" que gradualmente escalam em intensidade.


Fase de arrependimento e reconciliação


Após episódios de violência, vem o período de "lua de mel":


  • Pedidos intensos de perdão;

  • Promessas de mudança;

  • Presentes e demonstrações exageradas de afeto; e,

  • Comportamento exemplar temporário.


Este ciclo se repete, geralmente com intervalos cada vez menores entre os episódios de violência e com agressões progressivamente mais graves. A mulher, sob efeito da Síndrome de Oslo, tende a valorizar excessivamente os momentos de reconciliação, alimentando a esperança de que o comportamento violento cessará definitivamente.


Sinais de alerta: como identificar um relacionamento potencialmente abusivo


Reconhecer os primeiros sinais de um relacionamento abusivo pode fazer toda a diferença antes que a dependência psicológica se estabeleça. Fiquem atentas aos seguintes comportamentos:


Controle disfarçado de cuidado


  • Insiste em saber onde você está o tempo todo;

  • Verifica constantemente seu telefone, e-mails ou redes sociais;

  • Opina excessivamente sobre suas roupas, aparência ou amizades; e,

  • Faz você se sentir obrigada a pedir "permissão" para atividades cotidianas.


Isolamento progressivo


  • Não se esforça para conhecer seus amigos e familiares;

  • Faz comentários negativos sobre pessoas importantes para você;

  • Cria situações para impedir que você participe de eventos sociais; e,

  • Demonstra irritação quando você dedica tempo a outras pessoas.


Instabilidade emocional


  • Mudanças bruscas de humor, especialmente direcionadas a você;

  • Reações exageradas a pequenos problemas ou discordâncias; e,

  • Comportamento imprevisível que faz você "pisar em ovos".


Desrespeito aos limites


  • Insiste quando você diz "não" a qualquer coisa;

  • Não respeita sua privacidade;

  • Pressiona você em questões íntimas ou importantes; e,

  • Força situações para testar sua lealdade ou obediência.


Manipulação emocional


  • Usa frases como "se você me amasse de verdade...";

  • Faz você se sentir culpada por decisões pessoais;

  • Ameaça se machucar ou fazer algo drástico se você não ceder; e,

  • Alterna entre críticas severas e elogios excessivos.


Transferência de responsabilidade


  • Nunca assume culpa por problemas no relacionamento;

  • Justifica comportamentos inadequados culpando você;

  • Usa frases como "você me fez agir assim"; e,

  • Minimiza suas preocupações e sentimentos.


Como se proteger


Se você identificou vários desses sinais, considere estas medidas:


  1. Confie nos seus instintos: sensações de desconforto persistente são sinais importantes.

  2. Mantenha suas conexões: preserve suas amizades e vínculos familiares a todo custo.

  3. Estabeleça limites claros: comunique seus limites de forma assertiva e observe como a pessoa reage quando você diz "não".

  4. Busque informação: conhecer os padrões de relacionamentos abusivos ajuda a reconhecê-los.

  5. Procure ajuda profissional: um psicólogo pode ajudar a avaliar a dinâmica do relacionamento e fortalecer sua autoestima.

  6. Conheça seus direitos: informe-se sobre os recursos legais disponíveis como a Lei Maria da Penha.

  7. Tenha um plano de segurança: se já houver indícios de violência, saiba como e para onde ir em caso de emergência.

  8. Lembre-se sempre: ninguém tem o direito de controlar sua vida ou diminuir seu valor como pessoa.


A Síndrome de Oslo torna o rompimento do ciclo de violência doméstica particularmente desafiador. Entretanto, o primeiro passo para a libertação está no reconhecimento dos padrões abusivos e na compreensão de que sentimentos contraditórios em relação ao agressor são parte de um mecanismo psicológico de defesa, não um indicativo de um relacionamento saudável ou amor verdadeiro.




Fonte: Lei n. 11.340/06; e, BIFFE JUNIOR, João; LEITÃO JUNIOR, Joaquim. Concursos públicos terminologias e teorias inusitadas. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 18.


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